quarta-feira, 12 de junho de 2013

A questão da comunicação

O enfrentamento do problema da comunicação de massa é fundamental para a emancipação dos povos. Para mim, trata-se da questão mais importante a ser resolvida pelas democracias atualmente, razão pela qual considero indispensável sua abordagem aqui neste blog.
Ninguém duvida que a comunicação social foi apropriada pelos regimes totalitários do século 20, quando os meios de comunicação serviram de aparelhos ideológicos de estado. No entanto, a intensificação da associação de ideias entre liberdade, democracia e capitalismo a partir do final dos anos 1980 tem produzido uma cegueira que se estende até os círculos acadêmicos, de modo que as teorias democráticas contemporâneas não têm dedicado ou dedicam pouquíssima atenção ao papel central exercido pela mídia nas sociedades reais do século 21 – sociedades de massa, globalizadas e cindidas por classes sociais[1].
O que quero dizer é que se outrora a preocupação da tutela dos direitos individuais, como a liberdade de expressão, incidia sobre a ação estatal, impondo-lhe postura negativa (de não fazer, isto é, de não invadir a esfera privada), agora são as grandes empresas que tomaram esse lugar que era atribuído ao Estado. São elas que ameaçam a liberdade de expressão e que invadem a esfera privada. E, desse modo, acaba que todos ficam sob o controle do grande capital, inclusive o Estado, que é alimentado principalmente pela tributação oriunda das grandes corporações empresariais privadas. Se esta é a ordem inerente ao sistema capitalista, é, na verdade, exatamente diante dela que as liberdades individuais devem se afirmar, e não propriamente ou com direcionamento especialmente enfático em relação ao Estado, que, mais do que nunca, não passa de uma instância modelada e instrumentalizada pelo capital econômico.
 
Nesse novo tipo de totalitarismo, a reprodução e disseminação ideológica se operam em uma triste idiotização[2] geral da população, atuando em várias frentes: mídia impressa, rádio, televisão etc. Trata-se de um reino onde campeia impune o culto à personalidade dos medíocres, da publicidade degenerada indutora de comportamentos servis, da conspiração sistemática contra a memória, a dignidade, a cultura, a ciência e, sobretudo, contra a liberdade para o desenvolvimento humano baseado no pensamento livre de manipulações e conduções sistemáticas de ideias em um mesmo sentido ideológico.
 

A imprensa brasileira mente, é claro, mas manipula ainda que não minta. As teorias do gatekeeper e da parede e da lanterna tratam da manipulação, mesmo que apenas se fale a verdade. Na teoria do gatekeeper, a mídia funciona como um porteiro que diz: “esta verdade deixa passar, esta também, esta não, é perigosa, fica quietinha aí”. Já a teoria da parede e da lanterna funciona da seguinte maneira: imagine que toda a verdade do universo é ou está num grande muro à sua frente, mas ele está no escuro[3].


Você não é capaz de descrever como é todo o muro, apenas a parte que lhe mostram.

O escuro representa a ignorância total, ninguém sequer vê o muro, você pode caminhar até rebentar o nariz nele e não saberá o que te atingiu. Então a mídia é iluminadora, a mídia é uma lanterna que esclarece com sua luz. O problema é que toda lanterna tem um foco, que é a área onde a luz vai atingir. Não se pode iluminar todo o muro, apenas uma parte. E a malandragem está em decidir qual parte do muro quer ser mostrada. No caso do gatekeeper, qual verdade o porteiro vai deixar entrar.

Portanto, não é preciso haver mentira para haver um mito. De fato, a maioria dos mitos não são feitos na base da mentira e sim da omissão dos fatos e da pauta que a grande mídia dá pra este ou aquele assunto. A televisão? Ah, esta, então, com certeza te conduz feito um boi para lá e para cá (leia Sobre a Televisão, de Pierre Bourdieu).
Como não ser massa de manobra, como não ser mais um seduzido e cooptado pelo discurso midiático? Sendo crítico, isto é, formando um pensamento crítico. A crítica é a nossa arma e o dinheiro não a compra: o esforço pessoal é imprescindível, cada um precisa correr atrás de sua própria lucidez, uma lucidez que ninguém, além de você mesmo, pode lhe usurpar. Este blog não deixa de tentar contribuir para isso, pois acredito que quanto mais inspirações à construção do pensamento crítico pudermos espalhar pela internet, mais chances temos de promovê-lo para desencantar o mundo do sonambulismo que o tem movido.

 




[1] Vide Luis Felipe Miguel, Um Ponto Cego nas Teorias da Democracia: Os Meios de Comunicação.
[2] Cunhado na Grécia antiga, o sentido original da palavra “idiota” é aquele que não gosta de política.

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